Darwin e Deus https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br Um blog sobre teoria da evolução, ciência, religião e a terra de ninguém entre elas Mon, 15 Nov 2021 14:20:48 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Como a teoria da evolução ajuda a compreender novas pandemias https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/05/04/como-a-teoria-da-evolucao-ajuda-a-compreender-novas-pandemias/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/05/04/como-a-teoria-da-evolucao-ajuda-a-compreender-novas-pandemias/#respond Tue, 04 May 2021 16:16:28 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2021/05/Marburg_virus-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=6605 O vídeo abaixo é bem simples –aliás, na vertical até, como vocês podem ver. Gravei-o a pedido do pessoal da Livraria da Travessa para marcar o Darwin Day ou Dia de Darwin, no dia 12 de fevereiro deste ano. É uma brevíssima defesa da teoria da evolução como ferramenta para compreendermos os seres vivos ao nosso redor e, mais especificamente, a atual pandemia e seu causador, o vírus Sars-CoV-2.

Como o leitor deve ter reparado, estamos retomando os trabalhos no meu canal do YouTube. Então, agradeço a todos que puderem se inscrever por lá e ativar as notificações!

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O contexto histórico e epidemiológico da tragédia da Covid-19 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/05/03/o-contexto-historico-e-epidemiologico-da-tragedia-da-covid-19/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/05/03/o-contexto-historico-e-epidemiologico-da-tragedia-da-covid-19/#respond Mon, 03 May 2021 17:16:46 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/10/bolsonarovski-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=6598 Em países como o Brasil, que erraram feio na condução da pandemia, a Covid-19 fez a gente voltar um século ou mais no tempo. Tínhamos, a rigor, derrotado as doenças infecciosas e criado uma população que morria, na grande maioria dos casos, por causas crônicas, de longo prazo. Agora, pela primeira vez desde a gripe espanhola, uma única moléstia do tipo mata quase tanto quanto o câncer e problemas cardiovasculares. É esse o tema do novo vídeo do meu canal no YouTube, que acaba de voltar à ativa.

E não se esqueça, gentil leitor, de se inscrever e de ativar as notificações pra acompanhar os futuros vídeos!

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Proteção ambiental seria prevenção barata contra novas pandemias, diz grupo https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2020/07/23/protecao-ambiental-seria-prevencao-barata-contra-novas-pandemias-diz-grupo/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2020/07/23/protecao-ambiental-seria-prevencao-barata-contra-novas-pandemias-diz-grupo/#respond Thu, 23 Jul 2020 19:14:29 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2020/07/Pteronotus_parnellii-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=6338 Investimentos em redução do desmatamento, controle do tráfico de animais silvestres e monitoramento de possíveis doenças emergentes seriam uma maneira relativamente barata de evitar estragos causados por futuras pandemias, afirma um grupo de cientistas — principalmente se essas medidas forem comparadas com o custo de não fazer nada.

Em artigo na revista especializada Science, eles calculam que um programa de prevenção global desse tipo custaria, ao longo de dez anos, apenas 2% do prejuízo que a economia do planeta deve sofrer em 2020 com a crise da Covid-19 (pelo menos US$ 5 trilhões). Mesmo que uma pandemia com efeitos severos acontecesse apenas uma vez a cada cem ou 200 anos, o investimento ainda valeria a pena se ajudasse a reduzir o risco de um evento como esse pela metade.

Assinado por uma equipe internacional de pesquisadores em países como os EUA, o Quênia e a China, o trabalho contou ainda com a participação de Mariana Vale, do Departamento de Ecologia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).

O ponto de partida dos pesquisadores é simples: ao menos 60% das doenças emergentes modernas surgiram como moléstias infecciosas oriundas de animais, e a maioria delas veio de espécies silvestres. Em muitos casos, além disso, o surgimento de uma nova doença infecciosa depende de um tripé epidemiológico: 1)a espécie selvagem que funciona como reservatório de um novo vírus, 2)animais domésticos que entram em contato com essa espécie e passam a transmitir o patógeno e, por fim, 3)os seres humanos.

“A taxa de contato das pessoas com animais silvestres, o tamanho da população humana e de animais de criação e o tamanho da população de espécies que são possíveis reservatórios de novas doenças são três fatores importantes para o surgimento de novas pandemias”, diz a pesquisadora da UFRJ.

Entre essas espécies que funcionam como reservatórios, destacam-se os primatas e os morcegos, dois grupos muito abundantes e diversificados na Amazônia. Levando em conta o desmatamento crescente na região, bem como a presença de duas metrópoles (Belém e Manaus) com milhões de habitantes na região amazônica, ela considera que não se pode minimizar a chance de aparecimento de uma nova doença viral na área. “Não é um risco altíssimo, mas é alto, até porque são cidades conectadas com o resto do mundo, com voos internacionais para os EUA, por exemplo.”

A situação da Amazônia espelha a de outras regiões com florestas tropicais e alta biodiversidade mundo afora, como  boa parte da África e o Sudeste Asiático. Além do desmatamento puro e simples, essas regiões também estão sob pressão da fragmentação florestal, ou seja, a subdivisão da mata original em pedaços isolados, cercados de áreas de cultivo ou mesmo bairros urbanos por todos os lados. A fragmentação, por si só, aumenta as oportunidades de contato entre as espécies silvestres e as áreas dominadas por humanos, favorecendo, portanto, o risco de saltos de patógenos de uma espécie para outra.

Para os autores do artigo, a receita do que fazer é relativamente clara. Um dos primeiros passos, e talvez o mais hercúleo deles, é mapear em detalhes a diversidade de vírus e outros patógenos de reservatórios selvagens que poderiam infectar as populações humanas. Nesse ponto, o desconhecimento ainda impera. “Não consegui encontrar nenhum levantamento sobre os coronavírus em morcegos amazônicos, por exemplo. A lacuna é enorme, e no Brasil esse tipo de estudo é ainda mais incipiente do que no resto do mundo”, diz Vale.

Outra medida essencial é fortalecer os órgãos que controlam o tráfico de animais silvestres, que pode potencializar o contato entre pessoas e novos patógenos. Finalmente, ainda falta muito para uma vigilância eficaz de episódios em que um novo vírus fez o salto do hospedeiro animal para o ser humano — um estudo com financiamento de apenas US$ 200 mil em Bangladesh triplicou o número de detecções desses eventos no caso do vírus Nipah. Ele é causador de problemas respiratórios em porcos e encefalite (inflamação do cérebro) em humanos e seu reservatório são os morcegos.

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A saga do cocô que cura, agora em vídeo! https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2019/06/04/a-saga-do-coco-que-cura-agora-em-video/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2019/06/04/a-saga-do-coco-que-cura-agora-em-video/#respond Tue, 04 Jun 2019 18:19:09 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2019/06/cocôzinho-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=5790 Você engoliria cocô de outra pessoa, ou enfiaria esse cocô no seu fiofó, para tratar doenças? Por incrível que pareça, essa abordagem tem mostrado ser promissora, como explico neste nojento porém instrutivo vídeo! Lembrando que ele é um spin-off ou versão light desta reportagem que fiz recentemente para nosso glorioso caderno Ilustríssima.

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My name is LUCA https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2016/07/28/my-name-is-luca/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2016/07/28/my-name-is-luca/#respond Thu, 28 Jul 2016 14:45:23 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2016/07/chamine-e1469716932554-180x68.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=3731 E não, o LUCA de que estamos falando não vive no segundo andar, diferentemente do Luka do hit da boa e velha Suzanne Vega. Para os biólogos, “LUCA” é a sigla inglesa da expressão “último ancestral comum universal” e quer dizer exatamente isso: a criatura que estaria na raiz da árvore genealógica de todos os seres vivos de hoje, da qual todos nós descenderíamos. Um novo estudo acaba de fazer um retrato falado do LUCA, com base em análises de DNA, e os resultados dão mais força à ideia de que esse organismo — um micróbio bastante simples — teria vivido nas chaminés submarinas que existiam há bilhões de anos.

A pesquisa está na revista científica “Nature Microbiology” e foi coordenada por William Martin, da Universidade de Dusseldorf, na Alemanha. Basicamente, Martin e companhia analisaram um caminhão de genes de espécies microbianas — cerca de 6 milhões — e chegaram a uma lista bem menor de genes (cerca de 350) que parecem ser suficientemente antigos a ponto de serem atribuídos ao velho LUCA (não com a forma que possuem hoje, é claro, mas com formas similares). Muitos desses genes são compartilhados por bactérias e Archaea (micróbios simples sem núcleo, mas bem diferentes das bactérias), mas não todos, porque a ideia era identificar o que havia de especial no LUCA.

Os principais resultados: era um micro-organismo anaeróbico (ou seja, não vivia na presença de oxigênio; nada surpreendente, considerando que quase não havia oxigênio na Terra primitiva), usava gás carbônico para produzir energia, como as plantas atuais (mas por métodos bem diferentes); vivia num ambiente quente, rico em hidrogênio e ferro.

Esses últimos pontos apontam fortemente para a origem em chaminés vulcânicas submarinas, locais do fundo do oceano onde a água gelada do mar profundo entra em contato com os gases e minerais cuspidos por rombos na crosta do planeta. Outro detalhe importante é que LUCA parece não ter sido capaz de realizar sozinha certas reações químicas cruciais para a sobrevivência das células modernas — mas o ambientes das chaminés ou fumarolas submarinas teria quebrado o galho para ele, realizando naturalmente essas reações, de forma que a célula primitiva só precisava se aproveitar delas.

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Comida de micróbio marciano https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2015/09/28/comida-de-microbio-marciano/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2015/09/28/comida-de-microbio-marciano/#respond Mon, 28 Sep 2015 20:17:33 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=2928 A esta altura do campeonato, você só não ficou sabendo ainda da possível descoberta de água corrente sazonal em Marte se… bem, se você literalmente mora em Marte e não possui ao menos um radinho de pilha. (Para mais informações qualificadíssimas sobre o achado da Nasa, faça um favor a si mesmo e visite o blog Mensageiro Sideral, do meu amigo e colega Salvador Nogueira.) Neste breve post, vou me arriscar na seara do Salvador para tentar abordar a biologia e a bioquímica — especulativas ainda, claro — da coisa.

Ocorre que as supostas “águas de Marte”, ao que tudo indica, possuem alta concentração de sais conhecidos pelos singelos nomes de perclorato de sódio e perclorato de magnésio, entre outros. Desempacotando um pouco a nomenclatura: “perclorato” nada mais é que o nome dado à parte eletricamente negativa desses sais, que contém um átomo do elemento químico cloro (daí o nome) e quatro átomos de oxigênio. Esse treco é tóxico para seres humanos, podendo causar problemas de tireoide ou mesmo de pressão alta, segundo alguns estudos. Sinal vermelho para a suposta vida marciana, portanto?

Não se estivermos falando de bactérias e outros micróbios, como as misteriosas Archaea. Existem mais de 40 linhagens diferentes de micro-organismos que “comem” perclorato, ou seja, conseguem usá-lo em seu metabolismo.

Em geral, isso é feito graças a enzimas especiais, ou seja, moléculas que aceleram reações químicas no organismo dos micróbios, ajudando-os a “quebrar” moléculas complexas em pedaços menores. As tais enzimas, a perclorato-redutase e a clorito-dismutase, servem para fatiar esses sais, liberando os átomos de cloro e, veja você, o gás oxigênio, aquele mesmo que respiramos. Além da fotossíntese, realizada pelas plantas e por outros micróbios, o “desmanche” dos percloratos é um dos poucos processos biológicos que produzem oxigênio.

Fica aí, portanto, a dica para futuras missões da Nasa (é óbvio que eles já devem saber disso por lá): talvez farejar pequeninas quantidades de oxigênio perto dos “ribeirões” de Marte seja um caminho para detectar vida microbiana comendo percloratos por lá.

ADENDO RÁPIDO: A Nasa tem afirmado que as concentrações salinas dos riachos temporários marcianos são tão altas que nenhum micróbio terrestre aguentaria o tranco. Pode ser, mas e um micróbio nascido e criado em Marte?

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Tretas na origem da vida https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/12/08/tretas-na-origem-da-vida/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/12/08/tretas-na-origem-da-vida/#respond Mon, 08 Dec 2014 12:39:27 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=2114 Não é de hoje que os visitantes do blog têm manifestado muito interesse (aliás, um belicoso interesse, às vezes) pela questão da origem da vida no planeta, o que é muito natural levando em conta os temas que a gente aborda. Este post é uma brevíssima tentativa de colocar os pingos nos is. Certamente coisas importantes vão ficar de fora, mas ao menos vai ser um começo.

Primeiro detalhe importante: a rigor, a teoria da evolução não é uma teoria sobre a origem da vida na Terra, mas uma teoria sobre o que acontece depois que a vida surge, versando sobre os mecanismos de diversificação de espécies, aparecimento de adaptações que permitem a sobrevivência dessas espécies etc.

Dito isso, no entanto, o fato é que é comum e salutar a aplicação da lógica da biologia evolucionista aos primórdios da vida, em especial a ideia de seleção natural. Isso porque, a rigor, você não precisa de nada realmente “vivo” (seja lá o sentido no qual você aplica a palavra) para a seleção natural ocorrer. Só é preciso, na verdade, que você tenha entidades que possuam descendência com modificação. Ou seja: “coisas-mães” que produzam “coisas-filhas” um pouquinho diferentes de si próprias, e que essas diferenças sejam transmitidas de uma geração para outra e tenham algum impacto na capacidade desses entes de se propagar, de se multiplicar.

Ou seja: uma molécula ou conjunto de moléculas que, por qualquer motivo, seja capaz de levar a reações químicas que produzem cópias dela mesma com mais eficiência do que outras moléculas, e que transmita essa capacidade às “moléculas-filhas”, pode perfeitamente ser alvo de seleção natural, mesmo que esteja muito longe de integrar um ser vivo, ainda que muito simples.

É por isso que a gente pode pensar em seleção natural mesmo que não haja viva propriamente dita envolvida.

O ESPECTRO DO VITALISMO

Creio que outro problema sério pra explicar as questões que envolvem a origem da vida é o tal espectro do vitalismo — a ideia de que existe uma diferença essencial entre matéria viva e não viva.

É, temos de admitir, uma ideia muito natural — é o que os nossos instintos nos dizem toda vez que comparamos um grilo, ou mesmo uma bactéria, com uma pedra ou um copo d’água.

O problema é que os nossos instintos às vezes dão com os burros n’água. O que a bioquímica tem demonstrado desde o século 19 é que não existe essa diferença essencial entre matéria viva e não viva. Os componentes básicos do nosso organismo são átomos — de carbono, hidrogênio, nitrogênio, oxigênio, fósforo, ferro e por aí vai — que existem por aí, em tudo quanto é lugar no Universo. Não existe esse negócio de “átomos mágicos de vida”.

Quando a gente sobe um nível, para o das moléculas simples, é a mesma coisa. Existem aminoácidos — os “tijolos” usados para construir as proteínas — em cometas e nuvens moleculares espaço afora, muito longe da Terra. O mesmo vale para moléculas da família do álcool. Essas matérias-primas da vida, portanto, não apenas podem surgir de forma espontânea como, até onde sabemos, de fato surgem o tempo todo.

NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO

As dúvidas começam a aparecer quando a gente sobe mais alguns níveis e chega às moléculas grandes e complexas com potencial para transmitir informação genética, como o DNA e o RNA. Na verdade, o RNA — para quem não sabe, é a molécula “irmã” do mais famoso DNA, que hoje costuma transmitir informações do seu parente mais famoso para as máquinas de produção de proteínas das células — é o astro das pesquisas na área, porque variações dele conseguem tanto guardar informação genética como coordenar a produção de cópias de si mesmo, coisa que o DNA não consegue fazer.

É verdade que ainda não há um modelo claro para explicar como a primeira molécula capaz de guardar informação genética e propagá-la chegou a esse ponto — os debates são complicadinhos, e é melhor deixá-los para outros posts. Mas a questão central é que, de novo, estamos falando de estruturas de matéria seguindo as mesmas leis que a matéria não viva segue.

Pode ser que tenha sido necessária uma intervenção sobrenatural para dar o “start” nesse processo? Bem, é dificílimo “desprovar” uma ideia como essa, mas o mais prudente me parece assumir que, se processos naturais guiaram tudo o que aconteceu até o ponto do surgimento das matérias-primas da vida, não há motivos para achar que processos naturais não continuaram em ação depois disso. No mínimo, não dá para jogar a toalha enquanto não se tenta entender bem, do ponto de vista natural, o que pode ter acontecido. Essa é a tarefa dos cientistas que estudam a origem da vida.

Não sei se ficou claro, mas isso também significa que esses cientistas não estão dizendo que, de repente, algo tão complicado quanto uma célula de bactéria ou mesmo uma mitocôndria (a atual usina de energia das células complexas) surgiu a partir de moléculas simples. É bem provável que o “primeiro ser vivo”, seja lá o que ele tenha sido, fosse algo bem mais simples. Não existem seres vivos simples no mundo hoje porque eles são o resultado de 4 bilhões de anos de evolução. Eles são modelos adequados para os primeiros seres vivos apenas até certo ponto.

NEM É PRECISO QUERER

Finalmente, outro ponto ligado ao vitalismo que mencionei lá em cima: nas fases iniciais da evolução da vida — e mesmo em fases relativamente avançadas — não é preciso nenhum tipo de consciência para que as coisas aconteçam. Se você coloca moléculas de RNA com os insumos adequados em tubos de ensaio hoje, a seleção natural come solta e aquele troço evolui.

Por um motivo simples que eu expliquei acima: o processo tem uma lógica meio matemática, inescapável. Por definição, quem conseguir se multiplicar melhor — ainda que inconscientemente — é quem vai deixar descendentes; quem não consegue deixa de participar da história. A gente está olhando o resultado final de um processo no qual essas capacidades foram se tornando cada vez mais azeitadas.

Isso rompe a ideia de que “vida só surge de vida”, como Pasteur postulou no século 19? Só de um jeito muito limitado. Lembrem-se: a abiogênese do século 19 falava em seres complexos, como moscas, surgindo direto de carne putrefata. Não dizia nada sobre moléculas orgânicas adquirindo capacidades básicas de replicação.

E por que isso não acontece mais hoje? Porque o planeta está tão cheio de micróbios que nenhuma molécula orgânica fica muito tempo dando sopa antes de ser devorada. E por que não dá para fazer em laboratório? Em certo sentido, já dá. Biólogos moleculares podem encomendar sequências de DNA pelo correio e montarem genomas com elas, inserindo-os em células e alterando radicalmente um micro-organismo. Montar a célula inteira, molécula por molécula, seria muito trabalhoso — e ainda falta conhecimento pra isso. Mas não tem nada de impossível na tarefa.

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Estamos brincando de Deus? https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/04/04/estamos-brincando-de-deus/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/04/04/estamos-brincando-de-deus/#respond Fri, 04 Apr 2014 17:50:48 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=1265 O avanço crescente da chamada biologia sintética, como é conhecida a busca pela criação de genomas e organismos “sob medida” em laboratório, tem trazido à tona um velho espectro (ou talvez seja melhor dizer um velho “non sequitur”). Falo do temor algo exagerado de que os biólogos estejam querendo “brincar de Deus”, como o pessoal costuma dizer nos filmes de ficção científica. (Para quem quer o equivalente a um cursinho rápido sobre biologia sintética, escrevi sobre o tema aqui, aqui, aqui e, puxa vida, aqui também).

Queria aproveitar o espaço do blog pra tentar pontuar algumas das implicações bioéticas e, por que não, também teológicas dessa empreitada, ainda que muito brevemente.

Pra começar, o que os avanços na área mostraram de vez, se é que ainda havia necessidade disso, é que a diferença entre matéria não viva e viva é de organização apenas, e não de essência. Não existe “força vital” misteriosa: se for possível sintetizar direitinho em laboratório todos os componentes químicos do DNA de uma espécie e inseri-los com os devidos cuidados numa célula, essa célula vai passar a funcionar segundo essas instruções. DNA é software, células são hardware.

Não que isso devesse assustar alguém hoje em dia, diga-se de passagem. O fato de a vida ser um fenômeno material não a torna menos complexa e bela. Também não é o caso de achar que essa visão de como os seres vivos funcionam torna Deus irrelevante para quem acredita nele. Afinal, acreditar em Deus “só” porque ele teria sido necessário para criar diretamente as formas de vida é o clássico caso do chamado Deus das lacunas, ou seja, a divindade que só serve para tapar os buracos do nosso conhecimento.

O problema de se prender a esse tipo de visão do divino é que, quanto mais nosso conhecimento cresce, mais Deus parece encolher. E essa não me parece a mais sólida das bases para a fé religiosa.

PERIGO REAL E IMEDIATO?

Outra preocupação, bem diferente, é a que envolve a própria ética de criar esses organismos. É certo, afinal, colocar no mundo criaturas com genoma fabricado totalmente por seres humanos? Isso não é dar mole para o azar, ou para o próprio Apocalipse?

Primeiro, é preciso colocar as coisas em perspectiva. A saber:

1)Em si, o ato de criar variedades de seres vivos que não existem natureza tem uns 10 mil anos de idade, mais ou menos. Grande parte dos nossos cultivos mais importantes, que alimentam gente no mundo todo, são híbridos de espécies que, na natureza, eram separadas – a começar pelos singelos burros e mulas;

2)Plantas transgênicas estão aí já faz um par de décadas, sem danos apreciáveis para pessoas ou para o ambiente — embora a vigilância seja importante e necessária, claro;

3)O termo “sintético” pode, na verdade, passar a imagem errada. Embora a sequência de letras do DNA seja nova, todos os mecanismos biológicos usados nessas criaturas são, por enquanto, e serão por muitos anos ainda, meras recombinações do que existe na natureza;

4)Organismos criados em laboratório normalmente dependem de condições ideais de cultivo e possuem um “fitness” (grosso modo, uma capacidade de sobreviver e se reproduzir) bem inferior à de organismos selvagens.

Nada disso, claro, significa que não se deva todo o cuidado do mundo com o uso comercial ou científico desses organismos. O público precisa entender o que está por vir e ter voz nas decisões políticas e econômicas que envolvem essa tecnologia. Mas um temor “teológico” em relação à biologia sintética é injustificado. É melhor entender os potenciais, os perigos e as limitações da tecnologia — e seguir em frente com a pesquisa, com cautela, mas sem medo.

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Mais legal que a ficção https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/01/24/mais-legal-que-a-ficcao/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2014/01/24/mais-legal-que-a-ficcao/#respond Fri, 24 Jan 2014 16:04:32 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=980 É o tipo da coisa que não dá pra inventar. Escreve o biogeógrafo Alan de Queiroz:

“O pólen é um troço durão. A superfície externa dos grãos de pólen é feita principalmente de um negócio chamado esporopolenina, uma substância tão resistente à degradação que sua composição química não é completamente conhecida, porque nunca foi totalmente ‘quebrada’ para que fossem revelados seus componentes moleculares”.

Adamantium vegetal, minha gente.

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Frase da noite https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2013/09/29/frase-da-noite/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2013/09/29/frase-da-noite/#comments Mon, 30 Sep 2013 00:05:59 +0000 //f.i.uol.com.br/hunting/folha/1/common/logo-folha-facebook-share.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=642 “É claro que não existem verdadeiros micróbios primitivos (pelo menos na Terra), e já deveríamos saber muito bem que, embora os organismos individualmente possam parecer frágeis, o fenômeno da vida é espetacularmente durão.”

(Do livro “Soft Machines – Nanotechnology and Life” — “Máquinas Moles – Nanotecnologia e Vida” –, do britânico Richard Jones. Um lembrete sobre como é desafiador para a tecnologia humana reproduzir algo que chegue aos pés das maravilhas geradas ao longo de bilhões de anos de evolução.)

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