Darwin e Deus https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br Um blog sobre teoria da evolução, ciência, religião e a terra de ninguém entre elas Mon, 15 Nov 2021 14:20:48 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Qual seria o cartaz na parede de uma convenção de bonobos? https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/03/22/qual-seria-o-cartaz-na-parede-de-uma-convencao-de-bonobos/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/03/22/qual-seria-o-cartaz-na-parede-de-uma-convencao-de-bonobos/#respond Mon, 22 Mar 2021 20:55:35 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/01/bonoba-menor-180x119.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=6560 É só uma piada, mas me pareceu boa demais para não compartilhar com o gentil leitor do blog.

Qual seria o lema de uma convenção de bonobos (Pan paniscus), os simpáticos primos dos chimpanzés-comuns (também conhecidos como chimpanzés-pigmeus)?

“Bonobos: só não vale dar uns pegas na mamãe. Ache um buraco e seja feliz.”

(Para quem não sabe, os bonobos se notabilizam pela vida sexual promíscua e relaxada e pela baixa agressividade.)

A piada vem do divertidíssimo episódio sobre neandertais do podcast You’re Dead To Me, da BBC, apresentado pelo historiador Greg Jenner e com participação da especialista em neandertais Becky Wragg Sykes e do humorista Tim Minchin.

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Novos fósseis ajudam a reconstruir avô de todos os primatas https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/03/08/novos-fosseis-ajudam-a-reconstruir-avo-de-todos-os-primatas/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2021/03/08/novos-fosseis-ajudam-a-reconstruir-avo-de-todos-os-primatas/#respond Mon, 08 Mar 2021 12:59:13 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2021/03/Purgatorius_web-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=6541 O nome científico e a história do bichinho são irresistíveis: o Purgatorius mckeeveri, cuja reconstrução artística você pode conferir em toda a sua glória na imagem, é o mais antigo membro da linhagem dos primatas, a mesma que daria origem a micos-leões-dourados, chimpanzés e, claro, a eu e você.

Quão antigo? Quase tão antigo quanto os dinossauros. Os autores da descoberta da nova espécie de Purgatorius, liderados por Gregory Wilson Mantilla, da Universidade de Washington, em Seattle (EUA), estimam que o animal viveu há 65,9 milhões de anos, meros 100 mil anos após o evento de extinção em massa que acabou com o reinado dos dinossauros não-avianos. (A expressão exclui as aves, as quais, é claro, também são dinossauros. Digo “nova espécie de Purgatorius” porque o gênero já era conhecido.

Membro do grupo dos plesiadapiformes, o animalejo era onívoro, mas provavelmente tinha especial predileção por frutas. Os fósseis foram achados no estado americano de Montana, e a descrição oficial da descoberta está na revista especializada Royal Society Open Science.

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O primata com um minúsculo dedo extra, como o dos pandas https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2019/10/22/o-primata-com-um-minusculo-dedo-extra-como-o-dos-pandas/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2019/10/22/o-primata-com-um-minusculo-dedo-extra-como-o-dos-pandas/#respond Tue, 22 Oct 2019 20:05:01 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2019/10/ayeaye-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=5971 Dou uma passadinha rápida por aqui apenas para celebrar a extraordinária criatura acima, o aye-aye (Daubentonia madagascariensis). É o mais especializado de todos os lêmures, e acaba de ficar ainda mais especializado: uma análise anatômica de suas mãozinhas/patinhas da frente revelou que, ao lado do polegar, ele possui um minúsculo “pseudopolegar” ou sexto dedo, formado por uma pequena projeção óssea e cartilagem, tal como ocorre com os pandas. É o primeiro primata com essa característica.

Os pesquisadores ainda não sabem muito bem a função do dedo extra, embora o mais provável seja uma ajuda no apoio ao subir pelos galhos, já que os outros dedos estão muito especializados para escarafunchar e catar insetos.

Os resultados aparecem neste artigo da revista científica American Journal of Physical Anthropology, assinados por Adam Hartstone-Rose e colegas da Universidade Estadual da Carolina do Norte (EUA).

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Um vídeo explicando o óbvio: sim, nós somos um tipo de macaco https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/10/23/um-video-explicando-o-obvio-sim-nos-somos-um-tipo-de-macaco/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/10/23/um-video-explicando-o-obvio-sim-nos-somos-um-tipo-de-macaco/#respond Tue, 23 Oct 2018 13:57:29 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/03/mulher-veia-320x213.jpg https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=5484 Quem costuma ler o que escrevo sabe que eu gosto de dizer que nós, seres humanos, somos macacos, ou um tipo de macaco. Uma galera mais purista às vezes reclama. Neste vídeo, explico por que acho essa terminologia popular totalmente adequada. Em suma, eis o que me parece correto: se um zoólogo de outro planeta pousasse aqui e examinasse todas as nossas características relevantes — anatomia, comportamento, genética, registro fóssil –, ele perceberia sem sombra de dúvida que somos parentes muito próximos dos grandes primatas africanos (e de outros lugares do mundo). E que nome popular dar a um bicho assim? Macaco, ora bolas.

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O dia em que a gorila xingou o antropólogo (em linguagem de sinais) https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/06/30/o-dia-em-que-a-gorila-xingou-o-antropologo-em-linguagem-de-sinais/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/06/30/o-dia-em-que-a-gorila-xingou-o-antropologo-em-linguagem-de-sinais/#respond Sat, 30 Jun 2018 13:06:42 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/06/koko-320x213.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=5210 Fomos surpreendidos na semana passada pelo falecimento de Koko, a gorila americana de 46 anos que se celebrizou pela capacidade de se comunicar com a linguagem de sinais manuais criada por humanos (a mesma usada por pessoas com deficiência auditiva). Existem muitos relatos sobre o jeito criativo, ainda que bastante rudimentar, com o qual a símia usava os sinais, mas um dos mais interessantes está no livro “Moral Origins” (“Origens Morais”), do antropólogo americano Christopher Boehm. O pesquisador relata seu encontro com a gorila, que tinha um fascínio pelas obturações dos dentes dos humanos e não parava de lhe fazer o sinal de “mostrar dente” porque queria examinar a dentição de Boehm cuidadosamente.

Cansado de ficar de boca aberta, Boehm tentava mudar de assunto, enquanto a gorila continuava sinalizando “mostrar dente”, “mostrar dente”. O antropólogo enfim fechou a boca e não abriu mais. Koko então fez o sinal para… “privada”. É, aquele lugar que a gente usa para fazer as necessidades que ninguém pode fazer por nós. “Ela basicamente me chamou de cocô”, recorda Boehm. Pode um negócio desses?

Que a terra lhe seja leve, querida Koko.

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Por que a vida das mães humanas é tão complicada? https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/03/19/por-que-a-vida-das-maes-humanas-e-tao-complicada/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/03/19/por-que-a-vida-das-maes-humanas-e-tao-complicada/#respond Mon, 19 Mar 2018 18:09:03 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/03/mulher-veia-320x213.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=4893 Por motivos de falta de espaço, um texto que eu havia preparado para uma revista sobre as raízes biológicas da maternidade humana acabou não sendo publicado. É com prazer, portanto, que compartilho essa minha tentativa de resumir o que significa ser mãe na nossa espécie com os leitores do blog. Espero que gostem – o título de trabalho original era algo como “Predestinada a dar à luz?”.

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Qualquer pessoa com um mínimo de bom senso há de concordar que ser mulher e mãe não é brincadeira. Aliás, tem sido quase sempre assim desde antes de existirem mulheres propriamente ditas. A vida dura das genitoras humanas já estava esboçada, em grande medida, centenas de milhões de anos atrás, quando surgiram as diferenças de tamanho e características que ainda distinguem óvulos de espermatozoides.

Pode parecer maluquice, mas é a pura verdade. Essa distinção, que provavelmente é tão antiga quanto a origem dos primeiros animais, é o elemento mais básico que separa um sexo do outro e tem uma série de consequências importantes. A primeira delas: óvulos são proporcionalmente enormes – basta dizer que eles estão entre as raras células que a gente consegue observar a olho nu –, enquanto espermatozoides costumam ser nanicos. Esse tamanhão dos óvulos permite que eles armazenem uma quantidade considerável de nutrientes e outras moléculas essenciais para o desenvolvimento do futuro embrião; por outro lado, suas contrapartes masculinas não passam de micronadadores de longa distância, sem nem um tiquinho de gordura sobrando em sua estrutura celular.

Outra diferença crucial: óvulos são relativamente escassos, em especial entre mamíferos – não é à toa que existe o chamado ciclo menstrual, durante o qual eles são liberados aos pouquinhos (um por um ou, bem mais raramente, dois por vez no caso dos seres humanos) num período específico do mês. Em comparação, a tradicional falta de sutileza masculina fica clara: centenas de milhões de espermatozoides jorrados a cada ejaculação. Chega a dar vergonha.

Questão de economia
E daí? Daí que essas diferenças podem ser traduzidas em linguagem econômica de um jeito bem simples: em geral (grife mentalmente esse “em geral”, porque existe muita variação na natureza, óbvio), óvulos são caros, espermatozoides são baratos. Ou, só pra continuar falando em economês, o investimento reprodutivo que as moças da maioria das espécies fazem tende a ser maior do o que dos rapazes (de novo, em média, com exceções etc.). Isso acontece porque, primeiro, o organismo normalmente gasta mais energia e recursos para produzir células sexuais femininas do que masculinas.

Esse desequilíbrio fica ainda mais claro quando o óvulo fecundado é gestado dentro da barriga da mãe, como acontece com quase todos os mamíferos (embora certos machos também fiquem grávidos, como é o caso dos cavalos-marinhos). Além disso, é relativamente comum que investimentos pesados, daqueles que nem o BNDES toparia financiar, continuem após o nascimento da filharada, com a maior parte ou a totalidade do chamado cuidado parental – amamentar, carregar de lá para cá etc. – ficando nas costas da garota (de novo, exceções não faltam; em muitas espécies de aves, o papai tem grandes responsabilidades nessa esfera). Esse cenário geral vale para uma grande variedade de animais que adotam o cuidado parental – o que, claro, não é o caso dos muitos bichos que apenas botam seus ovos e deixam os bebês se virarem desde o nascimento, como as tartarugas-marinhas – e provavelmente é a regra para os mamíferos desde que eles surgiram, lá se vão mais de 200 milhões de anos.

Tartaruga-marinha: sem cuidado parental, diferentemente da nossa espécie (Crédito: Creative Commons)

Recorde agora que nós somos, no fundo, não mais que um tipo de grande símio africano com postura ereta e pouco pelo. As fêmeas humanas gestam seus bebês por nove meses e, quando os bichinhos nascem, são completamente indefesos, descoordenados e precisam mamar, às vezes por anos a fio. Tudo isso significa que o padrão mais comum de investimento reprodutivo entre outros mamíferos – e as assimetrias e os desequilíbrios entre os sexos que derivam dele – também se manifesta entre nós de certa maneira, o que explica parte importante do peso que recai sobre os ombros das mulheres desde que o mundo é mundo.

Ainda seguindo o raciocínio econômico dos últimos parágrafos, faz sentido que elas sejam significativamente mais seletivas na escolha de parceiros sexuais que os homens. Afinal, na era pré-anticoncepcionais confiáveis (ou seja, basicamente pelos séculos dos séculos, se descontarmos o piscar de olhos entre os anos 1960 e hoje), o espectro de uma gravidez provocada por sexo com o sujeito errado era assunto muito sério. Sempre que podiam escolher com quem gerar bebês, as mulheres tendiam, sabiamente, a não dar bola para qualquer mané (ou elas ou suas famílias, claro, mas temos boas razões para acreditar que uniões arranjadas são coisa recente, dos últimos 10 mil anos ou menos, quando fatores como riqueza e diferenciação social se tornaram comuns pela primeira vez). Homens, por sua vez, tinham incentivos consideravelmente maiores para investir seu suprimento virtualmente ilimitado de espermatozoides da maneira mais ampla possível: o que caísse na rede era peixe, certo?

Bem, mais ou menos – aqui, é preciso não traçar um cenário unilateral demais. Somos uma espécie mais complicada do que os gorilas ou elefantes-marinhos, bichos que formam haréns nos quais um único macho fecunda regularmente diversas fêmeas, enquanto os demais membros do sexo masculino ficam chupando o dedo (de novo, a poligamia parece ser uma invenção recente entre nós). Os pais da nossa espécie são meio preguiçosos, não se pode negar, mas ainda assim até que dão uma mãozinha considerável na criação dos bebês, e o mesmo deve ter valido desde as origens da linhagem humana, segundo a maioria dos antropólogos. Isso, claro, diminui um pouco a avidez deles no que diz respeito a saltar a cerca de casa. Por outro lado, desde que o mundo é mundo, mulheres assumem o risco de se envolver com outro parceiro se perceberem que o atual é um banana ou não dá a mínima para elas – ou seja, no fundo, quando se dão conta de que ele não está colaborando com sua parte no bolão do investimento reprodutivo.

Ressalvas à parte, porém, o fato é que, em média (e considerando que existe uma enorme variabilidade de comportamento de pessoa para pessoa, algo que a gente nunca pode esquecer), as diferenças entre os sexos que estão ligadas a causas biológicas ainda são significativas. E há dados intrigantes que sugerem que as repercussões disso vão além do comportamento sexual, afetando a maneira como as mulheres lidam com os anos de escola ou o mercado de trabalho, por exemplo.

Uma das defensoras dessa visão é a psicóloga do desenvolvimento canadense Susan Pinker, autora do livro “O Paradoxo Sexual”. O primeiro ponto ressaltado por ela é que, em média, não há diferença detectável de inteligência ou habilidade entre homens e mulheres: é basicamente balela sair por aí dizendo que meninas “não têm cabeça para matemática” ou não conseguem se impor quando viram chefes, por exemplo.

Dilema dos extremos
O curioso, no entanto, é que essa grande semelhança média ao que parece esconde uma diferença estatística significativa. No que diz respeito a diversas variáveis comportamentais e mentais, as mulheres têm uma tendência maior a serem relativamente normais e equilibradas, enquanto os homens acabam se espalhando mais para os extremos. Sem meias-palavras, parece que há mais gênios entre os homens, só que também há mais idiotas entre eles (essa segunda parte não deve ser surpresa para as mulheres, aliás). É plausível – embora seja difícil de demonstrar cabalmente – que isso tenha relação com as estratégias evolutivas diferentes de cada sexo: para os homens, valeria mais a pena “apostar” (de forma inconsciente, claro) em comportamentos extremos, que talvez trouxessem mais retorno em quantidade de parceiras sexuais, do que para as mulheres, para as quais táticas mais conservadoras seriam um jeito melhor de fazer desabrochar seu potencial reprodutivo.

Para Susan, isso também ajudaria a explicar por que, apesar do aumento do número de mulheres em posições de destaque em áreas como o direito e as ciências biológicas, elas ainda são minoria em física ou computação (campos que favorecem interesses muito específicos e, por vezes, estreitos) ou no comando de grandes empresas (ocupações nas quais se espera que o sujeito basicamente não tenha mais vida pessoal).

O indefectível Sheldon de “The Big Bang Theory”: exemplo dos extremos masculinos? (Crédito: Divulgação)

Isso quer dizer que as mulheres não são tão duronas profissionalmente? Pode ser justamente o contrário, argumenta ela. “Durante a crise financeira de 2008, mais homens perderam seus empregos e cometeram suicídio, enquanto as mulheres se recuperaram com muito mais facilidade, porque elas tinham uma tendência menor a colocar todos os seus ovos no mesmo cesto. Enquanto muitos homens trabalhavam 70 horas semanais num emprego único que envolvia um só conjunto de habilidades, elas tinham dois trabalhos de meio período, em ramos como serviços ou educação, que não fecham vagas com tanta facilidade”, diz Susan. Faz sentido imaginar que há alguma ligação entre tudo isso e a responsabilidade biológica que a mulher assume com a cria. Aliás, há alguns indícios de que o cérebro feminino lida melhor com o “multitasking”, a capacidade de fazer várias coisas ao mesmo tempo, e que isso tem relação com o efeito dos hormônios femininos sobre o sistema nervoso.

Será que tudo isso significa que exigir participação igual das mulheres em todas as áreas do conhecimento e do mercado de trabalho é utópico e até contraproducente, gerando um conflito desnecessário entre os sexos? Bem, a coisa é complicada. De um lado, ignorar a influência da biologia sobre tudo o que nós somos equivale a tapar o Sol com a peneira. De outro, biologia é importante, mas não é destino escrito nas estrelas – do contrário muita gente lendo esse texto teria morrido na infância por causa de infecções bobas que dizimavam as pessoas antes da invenção dos antibióticos. Talvez a maioria das mulheres continue a não se empolgar com a ideia de trabalhar como mecânica de caminhões ou de liderar uma multinacional, mesmo que as portas dessas carreiras estejam totalmente abertas para elas – e tudo bem, ora: a liberdade de escolher também deveria valer para quem não vê problema em seguir o caminho que parece ser o mais natural. Tudo bem, repito, desde que a gente não esqueça que pessoas são indivíduos, não médias populacionais: algumas mulheres (talvez a minoria?) escolherão caminhos que veríamos como “masculinos” – e não serão menos femininas, ou menos humanas, por causa disso. Nenhuma das duas possibilidades é motivo para a gente ficar arrancando os cabelos.

Por outro lado, não há motivo para não repensarmos o que entendemos por “sucesso” ou “liderança”, hoje com base em critérios tradicionalmente masculinos. Por que diabos uma alta executiva ou uma professora universitária de renome internacional deveriam ser forçadas a ficar longe de seus filhos, ou até se sentirem pressionadas a não formar uma família, para conseguir cumprir o papel tradicional de escravo do trabalho? Por que não criar incentivos para que empresas e órgãos governamentais deem mais espaço para creches de qualidade, horários flexíveis e “home office” (o popular trabalho em casa)? Medidas como essas podem muito bem criar ambientes mais equitativos e recompensadores pra todos, homens e mulheres. O escriba que vos fala sabe bem o que é isso: abri mão de ser editor de Ciência na Folha para morar no interior de São Paulo com a minha família e poder ver meus filhos todo santo dia. Não acho que eu seja “menos homem” por causa disso. Diferenças biológicas não deveriam ser vistas como camisas-de-força.

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Bonobos preferem valentões, afirma estudo americano https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/01/04/bonobos-preferem-valentoes-afirma-estudo-americano/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2018/01/04/bonobos-preferem-valentoes-afirma-estudo-americano/#respond Thu, 04 Jan 2018 17:34:51 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2018/01/bonoba-menor-180x119.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=4740 A fama de bonzinhos dos bonobos ou chimpanzés-pigmeus (Pan paniscus) talvez seja meio exagerada, afinal de contas. Experimentos feitos por pesquisadores da Universidade Duke, nos EUA, indicam que eles preferem interagir com valentões, e não com sujeitos bonzinhos, como é o caso da maioria dos seres humanos normais.

Os dados, publicados por Christopher Krupenye e Brian Hare na revista científica “Current Biology”, surpreendem porque a vida social dos bonobos parece muito mais tranquila que a de chimpanzés-comuns ou mesmo a de seres humanos, com tensões em geral resolvidas por meio do sexo. Krupenye e Hare, porém, resolveram aplicar aos grandes macacos um experimento já famoso no caso de estudos com bebês humanos: desenhos animados em que aparecem personagens “bonzinhos” e “malvados”.

Nesse tipo de desenho animado, um personagem em dificuldades (tentando carregar um objeto pesado, digamos) encontra dois outros sujeitos, um que tenta ajudá-lo e outro que o atrapalha. Depois, bonecos dessas personagens são apresentados aos “voluntários” do experimento que estavam assistindo (crianças ou bonobos). As crianças normalmente preferem interagir com o personagem “bonzinho”, mas a surpresa foi que os bonobos em geral parecem gostar da figura que atrapalhava o outro personagem.

Essa tendência foi confirmada quando os cientistas encenaram um teatrinho com os mesmos elementos do desenho animado. Nessa situação, os macacos também preferiram receber comida das mãos do “ator” (um dos cientistas) que era desrespeitoso com o outro sujeito da história.

Uma possível explicação para esse padrão, segundo os pesquisadores, é que os bonobos interpretam que os grosseirões são indivíduos dominantes de seu grupo e, por isso, tendem a preferi-los para não correr o risco de também ser maltratados. Tá caindo o mito dos macacos hippies, minha gente.

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Encruzilhada primata https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/02/17/encruzilhada-primata/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/02/17/encruzilhada-primata/#respond Fri, 17 Feb 2017 16:16:44 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2017/02/CebuQue2-e1487348144354-180x92.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=4065 Acabamos de falar dos macacos vitimados pela febre amarela e pela ignorância humana. E, de fato, a situação das criaturas que são os parentes mais próximos da humanidade na Árvore da Vida não é nada confortável, como contei em reportagem recente nesta Folha. Nada menos que 60% dos primatas deste planeta hoje corre risco de desaparecer. Um ponto importante que não consegui abordar nesse texto, por uma questão de tempo hábil, foram os detalhes da situação dos macacos brasileiros — a gente, afinal de contas, vive no país que tem a maior diversidade de primatas da Terra, com mais de uma centena de espécies.

Tento sanar um pouco esse lacuna com a entrevista abaixo, concedida por um importante trio de especialistas do Brasil: Sidney Gouveia, da Universidade Federal de Sergipe, Ricardo Dobrovolski, da Universidade Federal da Bahia, e Andreas Meyer, da Universidade Federal do Paraná. As respostas foram enviadas por e-mail, em conjunto, então são do trio mesmo, e não de cada um deles. Confira!
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1)Os dados levantados por vocês mostram o Brasil como o grande campeão mundial da biodiversidade de primatas, e ao mesmo tempo a situação no que diz respeito às ameaças de extinção parece menos severa do que em outros países-chave, como Madagáscar. Estamos fazendo razoavelmente bem a lição de casa, ao menos quando comparados a outros países, ou é só porque nossa diversidade é muito grande que os riscos não ficam tão evidentes?

Por ser um país megadiverso, com as maiores extensões de florestas tropicais do mundo, o Brasil estará sempre no centro das discussões globais sobre biodiversidade, para o bem e para o mal. O Brasil fez uma verdadeira revolução na conservação da biodiversidade quando reduziu o desmatamento na Amazônia de mais de 27 mil km2 no ano de 2004 para menos de 4600 km2 no ano de 2012.

No entanto, o Brasil não faz a sua lição quando alterou o Código Florestal, o que parece estar entre as principais causas do recente aumento do desmatamento, especialmente no último ano, quando esse valor foi de quase 8 mil km2. Além disso, outros biomas, especialmente o Cerrado, têm sido severamente destruídos, sem que isso receba a atenção direcionada à Amazônia. Quando falamos nessa perda de vegetação natural, estamos falando na perda de primatas, que dependem de florestas com grande biomassa e complexidade, como são as florestas tropicais, como mostramos em um artigo publicado no periódico Journal of Animal Ecology (Gouveia et al., 2014, Journal of Animal Ecology, 83: 1523-1530).

O Brasil é o país com a maior extensão dessas florestas e também o país campeão em desmatamento. Quando perdemos essas florestas tropicais e outros tipos de vegetação natural, como aquelas que encontramos na Caatinga e nos Campos Sulinos, estamos perdendo não apenas biodiversidade de primatas e outros grupos, mas também serviços ecossistêmicos associados, como comida, água, polinização e dispersão de sementes, realizados por primatas, necessários para a sobrevivência e o bem-estar das pessoas. Espécies de plantas da Mata Atlântica com sementes grandes podem estar ameaçadas pela perda de dispersores, entre eles os primatas.

Esse é o centro da questão: é a principal ameaça à biodiversidade e tem um efeito sinérgico com outras ameaças, ou seja, os efeitos das mudanças climáticas ou da caça são mais graves se continuarmos a destruir a vegetação natural. Temos exemplos de iniciativas importantes que contribuíram para a conservação dos primatas, como o programa de conservação do mico-leão-dourado e do muriqui-do-norte. Além disso existem instituições que desempenham papéis importantes, como é o caso do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros. No entanto, se não atuarmos sobre a perda de hábitat, a nossa biodiversidade, incluindo os primatas, está destinada à extinção.

2)Quais são as áreas e espécies que requerem maior atenção e preocupação neste momento no país, na avaliação de vocês? Além das espécies mais conhecidas da mata atlântica, como os diversos micos-leões e os muriquis, o avanço recente do desmatamento na Amazônia criou alguma situação complicada que não existia uma ou duas décadas atrás?

Os primatas, que conhecemos melhor pela proximidade filogenética (relação de parentesco), são um retrato de toda a biodiversidade. De maneira geral, no Brasil, a maior parte dos problemas estão concentrados na Mata Atlântica, que tem hoje algo como 14% de remanescentes. A cada dois anos o IUCN SSC Primate Specialist Group lança uma publicação com as 25 espécies de primatas mais ameaçados do mundo. Desde 2010, quatro espécies de primatas brasileiros entraram nessa lista: Sapajus flavius e Cebus kaapori, duas espécies de macaco-prego endêmicas das regiões Norte e Nordeste, Alouatta guariba guariba, uma subespécie do bugio-ruivo, endêmico da Mata Atlântica, e o Callicebus barbarabrownae, o guigó-da-caatinga, restrito à caatinga baiana.

Todas essas espécies são hoje criticamente ameaçadas de extinção, principalmente por fatores como perda de habitat e caça. Na Amazônia, algumas espécies já estão na listas de espécies ameaçadas da IUCN, como o bugio-da-mão-vermelha-do-Maranhão, Alouatta ululata, ou o Chiropotes satanas, já afetadas pelo arco do desmatamento amazônico.

E esses exemplos todos dizem respeito à espécies, que são o nível que os biólogos estão acostumados a pensar e a avaliar a crise de extinção. No entanto, há perdas de populações inteiras dessas espécies de primatas, com características genéticas e culturais únicas que são perdidas a cada ano, ainda que isso não altere necessariamente o status de conservação da espécie como um todo, que tem critérios bem rígidos de mudança de categoria de ameaça.

3)Dei uma olhada rápida no trabalho de modelagem do Andreas sobre mudanças climáticas e os micos-leões, que mostrou o risco de desaparecimento deles conforme este século for ficando mais quente. Além deles, há algum outro primata especialmente vulnerável sob essa prisma climático no Brasil?

Há sim. No ano passado, foi publicado um estudo (http://link.springer.com/article/10.1007%2Fs10764-016-9890-4) que avaliou a exposição de primatas às mudanças climáticas numa escala global. O estudo mostra que a maioria das espécies de primatas serão expostas a alterações climáticas até o fim deste século. No Brasil, essa exposição ocorrerá principalmente na Amazônia e na Mata Atlântica, o que representa uma ameaça adicional às espécies que ocorrem nessas regiões.

Além disso, publicamos um estudo no periódico Global Change Ecology (Gouveia et al., 2016 , Global Change Biology, 22: 2003–2012) que avaliou os impactos das mudanças climáticas e das mudanças de uso do solo para 5 espécies de guigós (gênero Callicebus) da Mata Atlântica e da Caatinga, e vimos que a configuração das áreas adequadas para essas espécies deve piorar muito nos próximos anos por conta dessas mudanças. Assim, a conservação da biodiversidade, representada no nosso estudo pelos primatas, está em aberto e vai depender daquilo que fizermos nos próximos anos, especialmente no que diz respeito ao uso do solo. Manter áreas naturais para a conservação da biodiversidade é fundamental para a sobrevivência dessas espécies que são necessárias para a sobrevivência e bem-estar de todos nós.

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Os macacos, a febre e o medo https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/02/16/os-macacos-a-febre-e-o-medo/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/02/16/os-macacos-a-febre-e-o-medo/#respond Thu, 16 Feb 2017 18:37:39 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2017/02/Howler_monkey-e1487269754989-180x68.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=4057 Em tempos de febre amarela voltando a rondar as cidades brasileiras, uma das primeiras vítimas acaba sendo o bom senso, infelizmente. Algumas pessoas andaram maltratando e até matando macacos por aí, achando que isso evitaria a propagação da doença, já que os bichos também podem ser infectados. Informação crucial: esse tipo de atitude, além de cruel, é burrice – os macacos na verdade são importantíssimos para evitar surtos piores de febre amarela, e são tão vítimas quanto nós. Esse é o tema do nosso vídeo de hoje. Confira abaixo!

Essas e outras informações cruciais para não transformar um problema de saúde pública em um problema ambiental estão neste informe do ICMBio, do Ministério do Meio Ambiente, e nesta carta aberta à imprensa redigida por importantes primatologistas brasileiros. Recomendo fortemente a leitura. Pra resumir, alguns pontos centrais:

– Os macacos NÃO SÃO reservatórios da doença – são hospedeiros e vítimas, como nós;

– Sem a presença dos macacos nas matas não há como saber quais são as áreas estratégicas para vacinar humanos;

– O espalhamento da doença, ao que tudo indica, não tem a ver com o deslocamento dos bichos porque eles não costumam andar por distâncias muito longas nem deixam o alto das árvores para atravessar áreas afetadas pela ação humana.

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Tinder para orangotangos https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/01/31/tinder-para-orangotangos/ https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/2017/01/31/tinder-para-orangotangos/#respond Tue, 31 Jan 2017 16:37:28 +0000 https://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/files/2017/01/1024px-Pongo_abelii_at_the_Philadelphia_Zoo_013-e1485880609914-180x57.jpg http://darwinedeus.blogfolha.uol.com.br/?p=4038 Recebo do extraordinário repórter, arabista e hebraísta Diogo Bercito, o homem que desbravou a Galileia a pé, uma notícia que vai abalar o mundo primatológico: Tinder para orangotangos. Tá no jornalão britânico “Guardian”.

E sim, a coisa é séria, apesar da comparação com o aplicativo de sexo casu… digo, de paquera. A ideia é estudar como funciona a escolha de parceiros entre esses grandes macacos, que estão entre os parentes mais próximos da nossa espécie e correm risco de extinção.

No Parque de Primatas Apenheul, localizado na Holanda, o biólogo Thomas Bionda e seus colegas vão mostrar imagens de orangotangos do sexo masculino na tela de um tablet para a fêmea Samboja, que tem 11 anos e faz parte de um programa internacional de reprodução de orangotangos em cativeiro.

Bionda explicou a uma rede de televisão holandesa que esses programas às vezes dão com os burros n’água porque um possível parceiro é trazido de zoológicos distantes mas, mesmo assim, a fêmea acaba se recusando a acasalar com ele. Espera-se que, se Samboja clicar nas fotos dos possíveis parceiros que prefere, esse problema seja superado.

E, falando em problemas, um dos desafios é reforçar a estrutura dos tablets para que as macacas não os destruam com sua força física bem superior à humana.

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