Os binóculos certos
Do magistral livro “A Arte da Narrativa Bíblica”, do crítico americano Robert Alter:
“A leitura de qualquer texto literário exige de nós a realização de toda sorte de operações de ligação, tanto em grande quanto em pequena escala, e requer, ao mesmo tempo, que façamos distinções constantes entre palavras, frases, ações, personagens, relações e situações que têm elos entre si mas são diferentes uns dos outros. O que tentei indicar ao longo deste estudo é que, na Bíblia, muitas das pistas oferecidas a nós para que façamos essas ligações e essas distinções dependem de um conjunto muito peculiar de procedimentos narrativos, e os leitores da nossa época precisam aprender esses procedimentos primeiro. A minha experiência, ao fazer um esforço concentrado para entender melhor a narrativa bíblica, é que esse aprendizado é mais prazeroso do que árduo. Conforme você descobre como fazer o ajuste fino desses binóculos literários, as narrativas bíblicas, que já mostram uma força própria logo de cara, revelam uma sutileza e uma inventividade surpreendentes em seus detalhes e, em muitos casos, uma completude cuidadosamente interligada. As figuras humanas que aparecem em seus cenários, dessa maneira, parecem mais vivas, mais complicadas e variadas, do que os preconceitos do leitor poderiam supor a princípio”.
Acho que esse é o erro de todo tipo de fundamentalista — seja o religioso quanto o antirreligioso: ler um dos textos mais complexos da tradição ocidental, produzido por muitas mãos ao longo de séculos, num mundo absurdamente diferente do nosso, como se tivesse sido escrito ontem num iPad.
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