Ainda sobre jacas

Reinaldo José Lopes

O leitor Mauro Márcio Oliveira, agrônomo, enviou-me uma mensagem interessante sobre a controversa jaca do novo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aldo Rebelo. (Ele sugeriu a naturalização das jaqueiras, conforme conto neste post recente.) Confiram abaixo.

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Prezado Reinaldo,

Queria tratar de seus comentários sobre o pronunciamento de Aldo Rebelo sobre a ‘naturalização’ da jaca.

[1] Suas informações materiais estão corretas: a jaca é originária da Índia ou do que era a Índia no século XVI e chegou aqui pelas mãos dos portugueses. Não posso dizer que a jaca veio da Índia para o Brasil diretamente. Pode até ter se dado o caso de uma triangulação em que num dos vértices está a Índia, no outro, algum outro país, e no terceiro, o Brasil.

[2] Até creio que Aldo Rebelo não tenha feito sua proposta tal como a entendo, mas teoricamente ele não falou uma besteira.

[3] Veja você, as espécies de um bioma dividem em: a) endêmicas (as que se desenvolvem quase que somente num bioma); b) universalistas (que se desenvolvem em muitos biomas); e, c) as de posição intermediária.

[4] A presença da jaca no Brasil, com bom desenvolvimento em quase todo o território nacional, indica que ela não é endêmica do bioma de origem. Se o fosse, não estaria tão difundida no Brasil. Não sendo endêmica, pode ser universalista. Se o for, se dará bem em biomas distintos do de sua origem.

[5] Ao ser universalista (hipoteticamente), não haveria nenhum problema agronômico ou ambiental em inscreve-la em áreas de recuperação de APP, reserva ou o que seja, mesmo porque, como exótica, não tem causado prejuízo ambiental aos biomas receptores como ocorre com algumas delas.

[6] Eu não recomendaria a jaca, nem a banana, nem o café, todas espécies exóticas, para “reconstruir um ambiente nativo do Brasil” como você disse, mesmo porque se a usasse nesse sentido eu estaria fazendo quase uma monocultura. Se tivermos que recuperar uma área com um stand de 1.000 árvores por hectare, não seria ‘ultrajante’ para os biomas nacionais se tivéssemos a presença de 30 ou 40 jaqueiras. Mas não 800 ou até 1.000.

[6] As espécies universalistas nos obrigam a entender que há biomas de ‘origem’ e de ‘destino’ e, portanto, não há nenhum sacrilégio em mesclar exóticas e nativas, desde que as exóticas sejam universalistas e não concorram com as nativas. Sou dos que acreditam existir a ‘hospitalidade ambiental’ em alguns biomas, inclusive no do Cerrado, o que acarreta a ‘recepção’ de algumas espécies exóticas nos trabalhos de restauração ambiental.

Atenciosamente,

Mauro Márcio Oliveira

Mini-CV: sou Agrônomo, com especialização, mestrado e doutorado e 40 anos de profissão. Atualmente, faço restauração de 3 fitofissionomias do Cerrado no Distrito Federal, usando, inclusive, espécies exóticas consideradas universalistas, mas de forma controlada.

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Tomara que a posição atual de Rebelo sobre essas questões seja tão nuançada quanto a expressa pelo Mauro. Infelizmente, não é o que as opiniões divulgadas publicamente pelo ministro indicam.

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