The neverending jaca

Reinaldo José Lopes

A discussão sobre algumas ideias exóticas (em mais de um sentido) do nosso novo ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aldo Rebelo, está rendendo aqui no blog. Após relatar a proposta de Rebelo em favor da “naturalização” da jaca (como você pode conferir clicando aqui), um leitor agrônomo me escreveu fazendo uma defesa, com muitas ressalvas, do uso de espécies não nativas para reflorestamento no país (confira neste post). Na sequência, recebi outra mensagem extremamente simpática e interessante de José Marcelo Torezan, biólogo e professor de ecologia vegetal da Universidade Estadual de Londrina, que tomo a liberdade de postar aqui com a permissão dele. Torezan explica algumas questões importantes relativas às consequências da chegada de espécies não nativas e vindas de outro continente, como as jacas, em especial quando são usadas em reflorestamento com o objetivo de refazer a vegetação original. Aí vai o texto dele.

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“Primeiro, os termos (endêmica, intermediária, “universalista”; na verdade nunca vi escrito assim) são rótulos empregados na biogeografia para tratar dos extremos de distribuição das espécies. A sutileza aqui é “muitos biomas”. Muitos biomas em contato, como Amazônia, Cerrado e Caatinga, é uma coisa, Índia e Brasil é outra. Isto acaba com uma confusão dos diabos. Existe todo um campo da pesquisa sobre invasões biológicas, e por invasor se entende qualquer organismo vindo de outra região biogeográfica (não de um bioma vizinho!) e que seja capaz de estabelecer populações estáveis e alterar a estrutura do ecossistema. A jaca pode ser invasora na Mata Atlântica mas não na Caatinga, por exemplo.

Segundo, há muita arrogância no conceito de restauração que está subjacente ao relato dele, e também na liberação geral que se pretende com a lei. O que chamamos corriqueiramente de restauração é uma etapa curtíssima (em geral menos de uma década) com algum controle humano. O grosso do trabalho será feito em décadas e, se pensarmos mais em diversidade e menos em estrutura, séculos. É a boa e velha sucessão secundária.

Ocorre que estas pessoas pensam que ao fazer um reflorestamento estão determinando definitivamente o tamanho das populações. Claro que não! Há espécies, nativas ou não, que não vão se estabelecer, e outras que vão “bombar”. As “30 ou 40 jaqueiras” podem virar facilmente “800 ou 1.000” (talvez seja isso o que ocorreu na Tijuca). E o mais importante, depois do “restaurador”, outras espécies virão espontaneamente, e a degradação do sítio e da paisagem do entorno determinarão a taxa de
colonização, e se as espécies ingressantes incluirão exóticas.

Concluindo: “naturalizar” a jaca ou qualquer outra é algo ocioso, já que a origem não é política, mas biogeográfica. Restaurar com espécies exóticas é até possível, mas é preciso contextualizar quanto à identidade da espécie (capacidade reprodutiva, histórico de invasão no bioma, etc), das condições do sítio e da paisagem, e dos recursos disponíveis para manejo. Não dá para liberar geral em uma lei aplicável ao país todo ou mesmo a um bioma inteiro.”

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