Homens, fés e bombas
“Radicais islâmicos foram os inventores do conceito de homem-bomba: verdadeiro ou falso?”. Imagine essa questão num Enem da vida, gentil leitor. Sou capaz de apostar que até alguns dos candidatos mais preparados, e 90% de quem está fazendo a prova, cravariam “Verdadeiro” e ainda colocariam um ponto de exclamação depois da palavra.
Mas estariam errando ridiculamente feio, claro.
Tenho a honra (ou melhor, a tristeza) de apresentar os Tigres Tâmeis, ou Tigres da Libertação de Tamil Eelam, um grupo paramilitar/terrorista do Sri Lanka, que já não existe mais (foi derrotado pelo governo de seu país em 2009). Os Tigres Tâmeis fizeram quase 400 ataques suicidas desde 1976, quando surgiram — e eram um grupo nacionalista SECULAR. Ou seja, cujos objetivos nada tinham a ver com religião. Esse pessoal se matava (matando outros junto, claro) porque era separatista e queria um Estado exclusivo da etnia tâmil — não porque achava que ia direto para o paraíso por isso.
Esclarecendo melhor: embora ataques suicidas usando granadas tenham ocorrido na Segunda Guerra Mundial (soldados chineses se explodindo para derrubar tanques japoneses, por exemplo), os Tigres Tâmeis foram os inventores do figurino “clássico” do homem-bomba: o sujeito que veste um colete ou um cinturão de explosivos debaixo da roupa e parte para explodir a si mesmo e a seu alvo. Foi desse jeito que eles mataram, por exemplo, o ex-primeiro-ministro da Índia Rajiv Gandhi em 1991 — aliás, foi uma mulher-bomba a responsável.
E no chamado mundo islâmico? Os primeiros casos de homens-bomba datam de meados dos anos 1980 — e, mesmo assim, em muitos casos o atacante pertencia a um grupo nacionalista secular, e não a um grupo radical religioso.
É fácil reproduzir estereótipos. Infelizmente, o mundo é complicado.
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