Pesquisador redescobre possível carta de Galileu sobre ciência e religião
O embate de titãs entre entre o cientista italiano Galileu Galilei (1564-1642) e a hierarquia da Igreja Católica no século 17 talvez se torne um episódio ainda mais fascinante com a descoberta de um manuscrito na biblioteca da Royal Society, secular sociedade científica do Reino Unido. Trata-se de uma carta em italiano, com a assinatura “G.G.” — pois é, seria a do próprio Galileu –, na qual o sábio argumenta em favor de sua interpretação não literalista da Bíblia, e da possibilidade de compatibilizar os textos das Escrituras com a ideia de que a Terra girava em torno do Sol.
A história está contada em detalhes neste texto da revista científica “Nature”. Em suma, o historiador da ciência italiano Salvatore Ricciardo, pós-doutorando da Universidade de Bérgamo, estava vasculhando o catálogo da biblioteca em busca de manuscritos interessantes quando topou com uma carta atribuída a Galileu.
Ao checar o texto, verificou que ela estava datada de 21 de dezembro de 1613, continha a famigerada assinatura — e várias rasuras, indicando que Galileu tinha revisado bastante o texto. Ainda não é certo que se trate de um documento de próprio punho, mas os indícios parecem fortes.
E quanto ao conteúdo? Bem, Galileu estava engajado num debate ferrenho — que acabaria lhe custando a liberdade — sobre as novas ideias do heliocentrismo (a ideia de que o Sol seria o centro do Sistema Solar e do Universo conhecido). No texto, ele diz que as descrições astronômicas da Bíblia teriam sido feitas por escribas que adequaram o conhecimento divino àquilo que as pessoas da época podiam entender; portanto, o heliocentrismo poderia ser “casado” com a fé nas Escrituras.
Mas o mais interessante não é isso. A questão é que cópias dessa carta circularam bastante no século 17 — Galileu, como um dos primeiros “cientistas-celebridades” da história, tinha suas cartas rotineiramente divulgadas. Só que a versão achada pelo historiador italiano agora tem, entre os rabiscos e substituições, detalhes bem significativos.
Num trecho, Galileu originalmente diz que as Escrituras “escondiam” seus dogmas — depois, riscou e escreveu “velavam”. Em outro, diz que frases da Bíblia são “falsas se for seguido o sentido literal das palavras”; depois, trocou “falsas” por “parecem diferentes da verdade”. Infelizmente, essa tentativa de amenizar tais ideias não foi suficiente para contentar a Inquisição.
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