Réptil fóssil brasileiro homenageia Aragorn, de O Senhor dos Anéis
O que poderia ser melhor do que a combinação entre paleontologia de vertebrados brasileira e “O Senhor dos Anéis”? A crise do coronavírus me impediu de cobrir devidamente esse encontro épico, mas finalmente tenho o prazer de apresentar aos leitores do blog o glorioso Elessaurus gondwanoccidens, o bicho aí de cima. O nome do gênero ao qual ele pertence deriva de Elessar, título que o heroico Aragorn da Saga do Anel assumiu ao subir ao trono de Gondor (perdão pelo spoiler pra quem ainda não leu SdA). Vocês já vão entender o porquê.
Estamos falando de um arcossauromorfo, ou seja, uma criatura que pertence a um grupo amplo que abriga todos os répteis que estão mais aparentados com crocodilos, pterosssauros (répteis voadores) e dinossauros do que com os demais répteis. Ficam fora da lista, portanto, cobras, lagartos e tartarugas.
O Elessaurus gondwanoccidens é um membro bastante primitivo desse grupo, tendo vivido numa região semidesértica, com rios temporários, onde hoje é o interior do Rio Grande do Sul, no município de São Francisco de Assis. Isso no Triássico Inferior, há uns 250 milhões de anos, logo após a pior extinção em massa da história da Terra, a do Permiano, que levou embora quase 90% das formas de vida macroscópicas.
Agora vem a parte fofa: a explicação do nome. Ocorre que os pesquisadores — time que inclui Tiane De-Oliveira e Leonardo Kerber, da Universidade Federal de Santa Maria, e Felipe Pinheiro, da Universidade Federal do Pampa — encontraram, como principal fóssil, uma pata de trás articulada (com os ossos na posição natural) e quase completa do bicho. (Também foram achados pedaços da pelve e algumas vértebras.) Como a perna era comprida, eles resolveram homenagear justamente Aragorn, cujo apelido era Passolargo (“Strider”, em inglês) por causa das pernas longas. Como o nome usado pelo personagem em sua coroação combina bem com “saurus”, ou lagarto, eles optaram por Elessaurus. Já gondwanoccidens se explica pelo fóssil vir da parte ocidental do supercontinente Gondwana, que incluía a América do Sul, é claro.
O fóssil ajuda ainda a esclarecer algumas hipóteses sobre a origem de seus parentes próximos, os tanistrofeídeos. Esses bichos tinham se adaptado à vida marinha, mas o Elessaurus é 100% terrestre, ao que tudo indica, sugerindo que o grupo se adaptou mais tarde aos ambientes aquáticos.
Os autores do estudo me pediram uma ajudinha, como especialista em Tolkien, para decidir que nome dar ao bicho, e meu nome consta dos agradecimentos do artigo científico na revista especializada de acesso livre PLoS ONE, o que muito me honra. É um enorme orgulho ter contribuído para esse pequeno detalhe do trabalho.
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